segunda-feira, 7 de março de 2011

Ensaie sua prova




Todo artista sabe que, para uma boa apresentação no palco, não basta afinar o canto, acertar a dança ou decorar as falas, é preciso ensaiar para que o espetáculo aconteça conforme o planejado. Pois o corredor que almeja fazer sua prova no tempo desejado também tem seus ensaios eles se chamam "tempo run".

A nomenclatura é moderna e recebe outras denominações, como intervalado longo ou time trial, mas nada mais é que um trabalho de ritmo em que o atleta, em um período ou quilometragem determinados, corre no pace próximo ao que pretende fazer na competição. 

Essa percepção, adquirida com a experiência, é importante para que o corredor aprenda a marcar suas passagens em percursos mais longos no tempo estipulado, ganhando confiança no momento da prova e, em alguns casos, dispensando até o uso das pulseiras de ritmo.

Sem extrapolar

O outro benefício do tempo run é fisiológico. Esse treino tem relação direta com o limiar anaeróbico  aquele ponto no seu metabolismo que, se ultrapassado pelo esforço do exercício, o ácido lático começa a se acumular mais do que é removido dos músculos, tornando a fadiga iminente. Com algumas sessões de treino, o tempo run ajudará a empurrar o limiar mais para a frente, permitindo que você suporte o esforço maior por mais tempo e assim se adapte ao ritmo desejado para a competição.

Esse ponto se situa entre 80% e 90% da frequência cardíaca máxima (FCM). Não confunda com o treino intervalado, cujos tiros são realizados acima de 90% da FCM, caracterizando um trabalho de força e potência. O tempo run é um trabalho de velocidade contínuo e, por ser sustentado por um período mais prolongado, deve ser forte, mas no limite do confortável. Por isso, o monitor cardíaco é recomendável durante esse treino. Se você ainda não sabe o seu pace nessa frequência, pode usar o acessório em um treino ou competição de 10 ou 15 km para descobrir.

Considerando esse “controle”, o tempo run deve ser feito por apenas uma "fração" da distância pretendida. Mesmo que você comece em um ritmo um pouco abaixo do limiar, ao longo da corrida sua frequência cardíaca ganha alguns batimentos a mais e, dependendo da duração, pode terminar muito acima, em déficit de oxigênio, o que não é o indicado. Quanto maior a distância, mais risco de perder o parâmetro, porque outros fatores começam a influenciar nesse rendimento, como o clima.

Novatos fora

O tempo run é indicado para aqueles corredores mais experientes que buscam ganhar velocidade e reduzir o tempo nas provas. Costumo aplicar o tempo run na fase de velocidade e força do treinamento a cada 15 dias.

Considero o treino mais duro e mais chato. O intervalado é mais forte, mas também mais curto. No tempo run você treina na zona do desconforto, mas a vantagem é que consegue suportar melhor essa situação na hora da prova. Passei a usar esse tipo de treino uma vez por semana e percebi a melhora da qualidade da minha corrida. Acostumado a fazer cerca de 7 a 8 km em um ritmo de 4min15/km, ele se surpreendeu ao conseguir manter o mesmo ritmo por todos os 16 km das 10 Milhas Mizuno em São Paulo, em julho.

Para atletas profissionais ou com objetivos ambiciosos, o tempo run é item fundamental na programação, como atesta Adriano Bastos, hexacampeão da Maratona da Disney. Com dois treinos intervalados por semana, ele ainda dedica uma sessão extra de tempo run na planilha todas as segundas-feiras. "Meu foco é a maratona. Costumo fazer 15 km ritmados, contínuos ou com breves intervalos de descanso ativo, para ampliar minha resistência ao esforço prolongado.

Como aplicar

Uma sessão de treino deve ser compreendida de 20 minutos de trote como aquecimento, o trabalho específico de tempo run e pelo menos 10 minutos de desaquecimento. "Em pista ou percurso medido, cada trecho de tempo run deve ser feito entre 10% e 25% da distância total do seu objetivo ou em períodos de 2 a 5 minutos. Para os 10 km, por exemplo, um dos trabalhos de ritmo mais comuns é realizar três baterias de 2 km, com 2 minutos de descanso.

O volume desse treino depende da condição individual do atleta e da sua prova-alvo. Uma das estratégias mais comuns e gerais é adotar os seguintes parâmetros de tempo:

Para 5 a 10 km

Corra 15 a 25 minutos ligeiramente acima do limiar anaeróbico.

Exemplo: Se o objetivo é correr 10 km em 50 min (5min/km), faça o tempo run entre 4min45 e 4min50/km

Para 15 a 25 km

Corra 25 a 45 minutos no ritmo do limiar anaeróbico.

Exemplo: Se o objetivo é fazer os 21 km em 1h45 (5min/km), faça o tempo run nesse mesmo ritmo.

Para os 42 km

Corra 40 a 60 minutos ligeiramente abaixo do limiar anaeróbico.

Exemplo: Se o objetivo é fazer os 42 km em 3h30 (5min/km), faça o tempo run entre 5min15 e 5min20/km

Para o treinador americano e colunista de RUNNER’S WORLD Jeff Galloway, o tempo run pode substituir um dia de treino intervalado de corrida ou ser uma sessão forte extra na planilha, para aqueles corredores mais experientes, como explica em seu Manual de Corrida. Segundo ele, se usá-lo no lugar de um intervalado ou fartlek, faça a distância programada do treino que está sendo substituído, mas, como sessão extra, procure fazer até um terço da distância da sua corrida para não se desgastar.

Seja como for sua aplicação, só não abra mão de se dedicar a esses ensaios. Ao se dedicar, você garante que sua apresentação nas pistas seja mais tranquila e, quem sabe, cheia de aplausos.